quarta-feira, 18 de maio de 2011

Conversas com Chico dos Bonecos

Quem o conhece não esquece. Chico dos Bonecos é poeta, brincador de ideias, entusiasta. De um de seus livros, Muitos dedos: enredos (Editora Peirópolis, 2005), escolho esse pensamento: "Na educação, na arte, na vida, o importante, mesmo!, é beber dos imprevistos".

O que importa, no "comércio" dialogal, dialético, da vida, é exportar palavras boas e importar boas palavras. Jogar conversa dentro. Dentro de nossa cabeça, dentro do nosso coração.

Outro livro do Chico (seu nome de batismo é Francisco Marques) — Desvendério (Editora Peirópolis, 2006). Com ilustrações de Carlos Dala Stella. A arte de contar uma história, preparar o leitor/ouvinte (pág. 55):

[..] Os fatos que serão narrados não aconteceram comigo. Tudo que vocês vão ouvir gudir foi contado de gurrunfado, ponto por ponto de maracutonto, pela querida vovó Maria xiringabutia. Estou, portanto, apenas recontando, passando adiante, sempre chaleirando o momentoso provérbio: Quem conta um conto omite um ponto e aumenta três.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Saldão à francesa

Na semana passada, soube que a unidade da Livraria Francesa na Vila Olímpia (SP) iria encerrar suas atividades em breve. E vai mesmo. No próximo dia 28 de junho.
Até lá, grande liquidação. Promoções incríveis. Não será uma saída à francesa, mas um saldão à francesa.  Descontos de até 80%.
Fui conferir e verificar. Comprei alguns livros. Entre eles, três:

Éloge du quotidien, de Tzvetan Todorov. Publicado em 1997. Não foi traduzido. O que é compreensível.

Trata-se de um "ensaio sobre a pintura holandesa do século XVII". Este subtítulo talvez assuste. A obra requer leitores que, pela própria natureza do tema, provavelmente poderão ler este ensaio em francês, ou em outro idioma. Os editores brasileiros não se arriscariam a colocar em nosso mercado um produto desses. Um pouco erudito ou específico demais...

Outro livro: Vers une économie politique élargie. Não o temos em português. A obra foi traduzida do inglês para o francês pelo próprio autor. Publicada em 1986.

O autor, Albert Hirschman, explora a antinomia "exit / voice" para analisar várias questões que envolvem busca de equilíbrio e reequilíbrio em sistemas econômicos, sociais e políticos. Ou mesmo numa questão mais caseira, digamos, como o divórcio. Num casamento em crise, a saída é "cair fora" (exit) ou conversar, "colocar as cartas na mesa" (voice)?
O terceiro livro: Le crépuscule des illusions, de 2002. Georges Gusdorf faleceu em 2000. Querer ler suas memórias "intempestivas" supõe interesses anexos, pois o autor não foi terrorista, artista ou esportista...

É necessário ter interesse pela cultura francesa. E por uma série de problemas e um certo modo de abordá-los que poderiam ser considerados ultrapassados.

Possivelmente não compraria esses livros se não fosse pelo desconto. A oportunidade é interessante. E para quem gosta de filosofia há muitos títulos disponíveis, no segundo andar da loja.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Conhecer, interpretar e mudar

Retrato da autoria
de Fernando Vicente,
ilustrador espanhol
O livro O mal ronda a terra (Objetiva, 2011), do historiador e escritor britânico Tony Judt (1948-2010), associa o título assustador a uma espantosa lucidez de seu autor, recentemente falecido.

Surpreendeu-me o tom do livro. Há informações sobre a realidade econômica do ocidente que não frequentam as páginas dos jornais. E uma visão crítica com relação a valores dominantes que conduziram a Europa e os EUA a uma situação social, hoje, problemática e preocupante.

Algo de filosofia o livro tem. Uma insatisfação boa, que fala em conhecer, interpretar, mas também em trabalhar para mudar. É o que percebo neste trecho (pág. 48):

Uma pesquisa entre estudantes ingleses realizada em 1949 mostrou que quanto mais inteligente o aluno fosse, mais tendência tinha a escolher uma carreira interessante, com salários razoáveis, em vez de um emprego que simplesmente lhe pagaria bem. Os estudantes e universitários de hoje conseguem imaginar poucas opções além de buscar um emprego lucrativo.

sábado, 7 de maio de 2011

Autoajuda qualificada

O gênero autoajuda é visto por muitos como subliteratura que induz ao autoengano. A leitura desse tipo de textos  nos convenceria a tomar consciência de que possuímos recursos mentais e morais de sobra para alcançar objetivos de vida e vencer dificuldades psicológicas, profissionais, existenciais etc. E que só nos falta um empurrãozinho para chegar lá!

Existe, porém, uma autoajuda qualificada. O autor catalão Xavier Guix (1952 - ) trabalha com uma bibliografia confiável — Jung, Viktor Frankl, Bauman, Compte-Sponville, Julián Marías, Eugenio Trías, Karl Jaspers, Mirce Eliade... enfim, não se trata de um "facilitador"...

Suas leituras, sua experiência como terapeuta e sua trajetória existencial ligada ao mundo da arte conferem ao seus textos um tom humanista e acessível, mas profundo.

Vejam três livros deste autor publicados em português, pela Editora Ciranda Cultural, em 2008:


Um trecho de Viva melhor (págs. 38-39):

É difícil viver com medo. Nada paralisa mais uma existência que o medo. Só se pode assumi-lo quanto cumpre sua função de advertência, por isso Norberto Levy o chama de funcional. Esse médico psicoterapeuta, defensor da dignidade do medo, define-o como um precioso sinal que indica um desequilíbrio entre a ameaça (física ou emocional) que enfrentamos e os recursos que temos para resolvê-la.

No entanto, a nossa confusão e ignorância fizeram dele "uma emoção negativa" que deve ser eliminada. Levy propõe abordar os códigos que se escondem por trás do medo, em vez de apagá-los ou afogá-los na repressão.